segunda-feira, 26 de maio de 2014

Moção de Censura ao Governo | Travar a política de exploração e empobrecimento, Construir uma política patriótica e de esquerda


O caminho para o abismo económico e social trilhado pelo atual Governo e o desprezo pelos interesses do povo e do País há muito evidenciam um Governo e uma maioria isolados política e socialmente pela luta dos trabalhadores e do povo e irremediavelmente derrotados. À falta de legitimidade política de um Governo que pratica uma política fora da lei e em confronto com a Constituição da República Portuguesa, soma-se agora a ilegitimidade democrática que resulta da devastação da sua base eleitoral. Perante o rumo de desastre económico e social para o qual o País está a ser arrastado não há nenhuma outra saída digna e democrática que não seja a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições antecipadas.

I

Uma política de exploração, empobrecimento e desastre económico e social

Quase três anos passados sobre o início de funções do XIX Governo Constitucional e da imposição pelas troicas nacional e estrangeira do Pacto de Agressão, a situação económica e social revela, em toda a sua dramática extensão, o resultado de um programa ao serviço do grande capital nacional e transnacional e do diretório de potências da União Europeia. Uma realidade que, desmentindo a propaganda, as manobras e mistificações, mostra um país mais dependente e diminuído na sua soberania, sem condições de crescimento económico sustentado, marcado por crescentes desigualdades e injustiças sociais.

A pretexto de um inventado «milagre económico», para consumo eleitoral, o Governo e os partidos que o suportam, recorreram e recorrem a grosseiras mistificações para iludir as consequências concretas na vida de milhões de portugueses de uma política orientada para liquidar direitos e favorecer a acumulação capitalista à custa da exploração dos trabalhadores, da destruição massiva de emprego e do empobrecimento da generalidade do povo. Manobras e mistificações que, sob a efabulação de uma «saída limpa» ou da retórica sobre a libertação do país da condição de «protetorado», tiveram e têm por objetivo esconder dos portugueses o projeto de amarrar Portugal à situação de dependência, por via dos mesmos ou de outros instrumentos de dominação da União Europeia (designadamente por via do Tratado Orçamental). Manobras, mentiras e mistificações que, invocando a consolidação orçamental e a confiança dos «mercados», ambicionam poder perpetuar a exploração, a redução dos salários, a liquidação do direito à saúde, à educação e à proteção social, num caminho de comprometimento da soberania nacional.

Tendo definido como objetivo central da ação governativa o empobrecimento do povo e do país, o Governo e a maioria que o suporta pretendem prosseguir uma política de destruição das condições de vida de milhões de portugueses. A proclamação de que «o país está melhor, a vida dos portugueses é que não», é reveladora do desprezo pelas condições de vida dos trabalhadores e do povo e da natureza de uma política de exploração e agravamento das desigualdades e injustiças sociais.

Três anos passados sob o manto do Pacto de Agressão que PSD, PS e CDS subscreveram, a obra de destruição do País e das condições de vida dos portugueses está à vista: mais 670 mil desempregados, 470 mil empregos destruídos, 600 mil portugueses lançados na pobreza (elevando para quase três milhões o seu número total), uma recessão superior a 6 % sem precedentes desde a 2ª Guerra Mundial, mais de 200 mil portugueses condenados a uma emigração forçada, quase 100 mil empresas liquidadas, um país mais endividado e sujeito a um serviço da dívida insustentável, entrega ao grande capital (sobretudo estrangeiro) de empresas e sectores estratégicos indispensáveis ao desenvolvimento do país, destruição de serviços públicos e das funções sociais do Estado. Ao mesmo tempo, avolumam-se as desigualdades e injustiças, polariza-se a riqueza em meia dúzia de grupos económicos, oferecem-se pacotes milionários de apoio à banca e transferem-se para os bolsos dos que especulam com a dívida portuguesa os rendimentos dos trabalhadores e do povo.

Uma política de esbulho dos rendimentos dos trabalhadores e dos reformados, de saque às famílias e aos micro, pequenos e médios empresários, de imposição de novas obrigações fiscais sobre os pequenos e médios agricultores, de degradação das funções sociais do Estado que, presente no Orçamento do Estado para 2014, conheceu já novas medidas de agravamento com o aumento da «Contribuição Extraordinária de Solidariedade» e dos descontos para a ADSE, que constituirão uma nova redução nos rendimentos de centenas de milhares de portugueses. E, por outro lado, de incentivo e manutenção de privilégios ao grande capital, como o testemunha o escandaloso volume de benefícios fiscais concedidos aos grupos económicos e ocultados da Conta Geral do Estado (mais de mil milhões de euros em 2012), de bónus fiscal por via da redução do IRC que, a par da impunidade patente na prescrição de responsabilidades financeiras de milhões de euros devidas por banqueiros ao Estado, é parte do processo de polarização da riqueza que aumenta a fortuna de alguns poucos à custa da miséria de muitos.

Não há campanha de mistificação que possa ocultar este caminho que o Governo pretende impor de condenação perpétua do país à dependência e do povo ao empobrecimento, que passa por tornar definitivos os cortes dos salários, pensões e apoios sociais que apresentaram como temporários; pela promoção da precariedade e redução de salários; pelas alterações para pior do Código do Trabalho (facilitação dos despedimentos e fragilização da contratação coletiva); pelo ataque ao direito à reforma, aos serviços públicos e às funções sociais do Estado; pelo estrangulamento da atividade dos pequenos e médios empresários e dos pequenos e médios agricultores; pela alteração à Lei dos Baldios que pretende esbulhar aos compartes o direito ao seu uso, gestão e propriedade; pela alienação da capacidade produtiva nacional; pela transferência para o grande capital nacional e transnacional de empresas e sectores estratégicos por via do processo de privatizações que tem vindo a ser concretizado (Cimpor, EDP, CTT, ENVC, EGF, CGD, TAP, ANA, Águas de Portugal, entre outras); pela submissão do país ao garrote de uma dívida que compromete a soberania, impede o investimento público e o crescimento e desenvolvimento económico e torna cada vez mais insuportável a vida do povo português.

A mais grave situação nacional desde os tempos do fascismo torna indesmentível o retrocesso económico e social a que conduziu a política de direita executada nos últimos 37 anos por sucessivos governos, agravada nos últimos anos pela execução dos PEC e do Pacto de Agressão assinado por PS, PSD e CDS com a troica estrangeira do FMI, BCE e Comissão Europeia.

A urgência da demissão deste Governo é tão mais atual e imperiosa quanto o Governo se prepara para, numa “fuga para a frente”, desencadear um novo assalto a salários e direitos como o Documento de Estratégia Orçamental confirma.

A apresentação da chamada “estratégia de médio prazo”, que o Conselho de Ministros de 17 de maio aprovou numa operação de propaganda e vassalagem junto dos especuladores internacionais, é disso testemunho: uma estratégia assente no Documento de Estratégia Orçamental e no Guião para a Reforma do Estado com o que isso significa de mais cortes nos salários e pensões tornando o que era transitório em definitivo e o que era excecional em permanente, mais impostos sobre os trabalhadores e o povo (de que é exemplo o aumento da TSU e do IVA), mais dificuldades no acesso à saúde, à educação e à proteção social, no quadro de um crescimento económico quando muito residual e de uma taxa de desemprego insuportável, em que os grupos económicos continuam a beneficiar de mais privilégios, apoios e benefícios fiscais.

A proposta de revisão do Código do Trabalho visando a destruição da contratação coletiva, com o que ela comporta de garantia de direitos e rendimentos dos trabalhadores, a legislação laboral da administração pública e a proposta dos chamados “benefícios fiscais ao investimento”, que não é mais do que um novo e milionário pacote de benesse fiscal ao grande capital, são testemunho da intenção do Governo intensificar a sua política de exploração, empobrecimento e agravamento das injustiças.

Uma demissão tanto mais urgente e imperiosa quanto, para lá da cortina de propaganda, dos sinais de retoma e do “milagre económico”, o País se continua a afundar sob o peso de uma dívida insustentável que impede o desenvolvimento e crescimento económicos, como comprovam os indicadores dos últimos dias que dão conta de um novo aumento da dívida pública no final do primeiro trimestre de 2014 (a fixar-se num novo máximo de 132.4% do PIB), do agravamento acentuado do défice orçamental no último mês do quadrimestre e, em particular, o regresso a novas quebras do PIB neste trimestre (quebra de 0.7% em cadeia).

Ao mesmo tempo que o Governo procurava celebrar a alegada “saída limpa” do pacto com a troica, não faltavam vozes nos círculos governantes, corroboradas pelo Presidente da República, a afirmar a convicção de que a submissão perante a troica, os “mercados financeiros” e os ditames do Pacto de Estabilidade iriam obrigar os portugueses a mais 25 anos de empobrecimento. A ameaça da eternização desta política coloca os trabalhadores e o povo perante a necessidade de lhe resistir e torna imperiosa a exigência da demissão do Governo e da convocação de eleições legislativas antecipadas, abrindo o caminho a uma alternativa política.

II

O isolamento social e político do Governo PSD/CDS

Ao fim de quase três anos de mandato é evidente o isolamento social e político do Governo PSD/CDS-PP de Passos Coelho e Paulo Portas.

A ação política e legislativa do Governo tem-se caracterizado por um permanente confronto com a Constituição da República Portuguesa e com os valores, princípios e direitos democráticos nela consagrados.

Perante a legítima declaração de inconstitucionalidade de algumas das medidas violadoras de princípios constitucionais fundamentais, o Governo prossegue a sua afronta ao povo português, ameaça com novas e mais graves medidas e põe em causa, através de uma chantagem permanente sobre o Tribunal Constitucional, princípios basilares do regime democrático como a própria existência de mecanismos institucionais que assegurem o respeito pela Constituição.

Portugal e o povo português estão a braços com um Governo que, assumindo uma política de subversão do regime democrático e de confronto com a Constituição da República Portuguesa, põe em causa o regular funcionamento das instituições democráticas e apenas permanece em funções devido à conivência e apoio do grande capital e do Presidente da República que, ao arrepio do juramento que fez de cumprir e fazer cumprir a Constituição, dá cobertura às suas políticas.

A intensa e ampla luta travada pelos trabalhadores e pelo povo português ao longo destes anos confirmou o crescente sentimento de rejeição da política de direita e isolamento do Governo que a executa, agora traduzido no pior resultado eleitoral de sempre de PSD e CDS-PP.

A clamorosa derrota sofrida por PSD e CDS-PP nas eleições para o Parlamento Europeu do passado dia 25 de maio, representa uma poderosa manifestação de vontade do povo português em interromper este caminho de desastre a que a Assembleia da República não pode permanecer alheia.

Nestas eleições, os portugueses demonstraram com total clareza a sua exigência de demissão do Governo e de convocação de eleições legislativas antecipadas que abram caminho, não a uma alternância política sem alternativas, mas a uma verdadeira política alternativa.

III

A ruptura com a política de direita e a construção da política alternativa, patriótica e de esquerda de que o país necessita

Os resultados eleitorais deixam ainda mais evidente para um número cada vez maior de portugueses a necessidade e a urgência de ruptura com esta política de afundamento nacional e agravamento das desigualdades e injustiças que empurra o País para o desastre e compromete a sua soberania e independência.

A derrota do Governo PSD/CDS-PP e a convocação de eleições antecipadas são condições indispensáveis para abrir caminho a uma verdadeira mudança de política. Uma mudança de política que não se basta com alterações pontuais de designação ou intensidade das medidas e políticas adotadas, antes exige a ruptura com a política de direita em Portugal e com os eixos fundamentais do processo de integração capitalista europeu.

A situação evidencia cada vez mais a necessidade e urgência de uma política que, afirmando os interesses do povo e do País e a decisão soberana do povo português, se baseie em seis opções fundamentais e indispensáveis:

• a rejeição dos condicionalismos externos e a renegociação da dívida nos seus montantes, juros, prazos e condições de pagamento rejeitando a sua parte ilegítima, com a assunção imediata de uma moratória negociada ou unilateral e com redução do serviço da dívida para um nível compatível com o crescimento económico e a melhoria das condições de vida;

• a defesa e o aumento da produção nacional, a recuperação para o Estado do sector financeiro e de outras empresas e sectores estratégicos indispensáveis ao apoio à economia, o aumento do investimento público e o fomento da procura interna;

• a valorização efetiva dos salários e pensões e o explícito compromisso de reposição de salários, rendimentos e direitos roubados, incluindo nas prestações sociais;

• a opção por uma política orçamental de combate ao despesismo, à despesa sumptuária, baseada numa componente fiscal de aumento da tributação dos dividendos e lucros do grande capital e de alívio dos trabalhadores e das pequenas e médias empresas, garantindo as verbas necessárias ao funcionamento eficaz do Estado e do investimento público;

• uma política de defesa e recuperação dos serviços públicos, em particular nas funções sociais do Estado (saúde, educação e segurança social), reforçando os seus meios humanos e materiais, como elemento essencial à concretização dos direitos do povo e ao desenvolvimento do País;

• a assunção de uma política soberana e a afirmação do primado dos interesses nacionais nas relações com a União Europeia, diversificando as relações económicas e financeiras e adoptando as medidas que preparem o País face a uma saída do Euro, seja por decisão do povo português, seja por desenvolvimentos da crise da União Europeia.

Uma política patriótica e de esquerda que retome os valores de Abril e dê cumprimento ao projeto de progresso e justiça social que a Constituição da República Portuguesa consagra.

Esta moção de censura traduz o sentimento popular de rejeição da política de direita e do Governo que a executa e corresponde à exigência de uma política patriótica e de esquerda, necessária a um futuro de progresso e desenvolvimento do país.

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