Após cerca de três anos marcados
por uma brutal redução das remunerações dos trabalhadores e dos reformados e
pensionistas, da promulgação pelo Presidente da República do Orçamento do
Estado para 2014, o pior OE desde o fascismo, os portugueses estão, desde de
ontem, confrontados com novos e graves aumentos de preços de bens essenciais,
nomeadamente: 2,8% na tarifa da eletricidade e do gás natural, 1% em média nos
transportes, 0,6% nas taxas moderadoras hospitalares, 1% nas rendas das casas,
2 a 2,5% nas telecomunicações, entre outros previstos, como por exemplo para
os audiovisuais.
Estamos perante um conjunto de aumentos de
preços inaceitáveis porque injustos, que vêm acentuar a perda de poder de
compra dos salários, reformas e pensões, agravando desta forma as condições de
vida da esmagadora maioria dos portugueses, vêm aumentar o endividamento das
famílias e, simultaneamente, favorecer a manutenção de lucros fabulosos dos
grandes grupos económicos e financeiros.
Bem pode o governo vir dizer que alguns destes
aumentos são menos agressivos do que os verificados em 2012 e 2013. A dimensão
das consequências para o orçamento das famílias não pode ser avaliada sem que
se tenha em conta que, ao longo destes últimos três anos, foi imposta ao país e
aos portugueses uma política que soma austeridade à austeridade, impondo uma
redução drástica do rendimento disponível das famílias portuguesas devido ao
roubo verificado de uma parte dos salários e reformas, do aumento brutal dos
impostos, nomeadamente o IRS e o IVA, mas também do aumento significativo dos preços de bens
essenciais.
A realidade é que neste período as
remunerações dos trabalhadores, reformados e pensionistas tiveram uma quebra,
em termos nominais, de 9,2% (8 mil milhões de euros) e a inflação acumulada foi
de 7%, o que significa, uma quebra real das remunerações de 16%. Situação que
só não foi ainda mais grave devido ao facto do Tribunal Constitucional ter
chumbado a norma que pretendia retirar os dois subsídios aos reformados e
pensionistas e o subsídio de Natal aos trabalhadores da Administração Pública e
sector empresarial do Estado. Se assim não fosse, a quebra das remunerações
teria sido superior a 20%.
Foram cerca de três anos em que a quebra do
consumo atingiu cerca de 9%, o que contribuiu decisivamente para o encerramento
de milhares de empresas e a extinção de milhares de postos de trabalho, 395.200
segundo dados do 3º trimestre do Inquérito ao Emprego realizado pelo Instituto
Nacional de Estatística.
Com os cortes previstos no OE/2014 para os
salários dos trabalhadores da Administração Pública e sector empresarial do
Estado, que atingirão em média 9,3%, e o não descongelamento dos escalões do
IRS, a par de outras medidas restritivas nele inscritas, a quebra do poder de
compra dos salários, das reformas e pensões continuará em queda acentuada.
Tal como o último inquérito publicado pelo INE
em 2012, sobre as despesas familiares, referente a 2010 e 2011 indica que, já
nessa altura, cerca de 50% do orçamento familiar era destinado às despesas com
a habitação (renda, água, eletricidade e outros combustíveis) e os transportes.
Se tivermos em conta os aumentos de preços acumulados, referentes a 2012 e 2013
– habitação 11,4% e transportes combinados de passageiros 14,6%, - ficamos com uma ideia mais precisa do que
significam para os orçamentos familiares os aumentos já em vigor e os
anunciados para os próximos meses.
Ao mesmo tempo que se agrava a
exploração dos trabalhadores e se reduzem os seus rendimentos, alguns dos
aumentos anunciados visam claramente o favorecimento de grandes grupos
económicos nacionais e transnacionais, como é o caso da EDP e da PT.
No caso da eletricidade, o
aumento de 2,8% para os utentes do mercado regulado, em vigor a partir do
passado dia 1, é tanto mais inaceitável, quando estamos a falar de uma empresa
que só nos primeiros nove meses de 2013 obteve um lucro de 941 milhões de euros, depois de em
2012 ter obtido 910 milhões de euros.
Num contexto de cessação das tarifas reguladas
(a efetuar até 2015) para todos os consumidores de eletricidade e gás natural,
incluindo a generalidade dos pequenos consumidores, o aumento agora em vigor
que, sendo destinado apenas aos utentes do mercado regulado, não pode deixar de
ser avaliado como uma forma de chantagem sobre as famílias que não optaram pela
tarifa no mercado liberalizado. É cada vez mais evidente a intenção de meter todos os consumidores no mercado
liberalizado para, em seguida, generalizar o aumento da tarifa e garantir às
empresas que fornecem energia taxas de lucro fabulosas, já que a decisão de
liberalizar o mercado não vai trazer a prometida livre concorrência, mas a mais
pura e dura cartelização dos preços, tal como o PCP denunciou na devida
altura.
Nas telecomunicações e apesar de
não estar ainda decidido, fala-se em 2 a 2,5% o aumento previsto. No caso da
PT, estamos a falar de uma empresa que nos últimos dois anos obteve lucros de
500 milhões de euros.
Na saúde, é escandalosa e
profundamente injusta a decisão do governo de impor o aumento de 0,6% nas taxas
moderadoras pagas no acesso aos cuidados hospitalares, quando se sabe - todos
os estudos apontam para uma redução muito significativa do acesso aos cuidados
de saúde, como se pode aferir na redução
das consultas da especialidade, no acesso às urgências, tratamentos e
exames de diagnóstico – que com esta medida, associada aos cortes inscritos no
Orçamento do Estado, superiores a 300 milhões de euros para os hospitais, mais
portugueses vão deixar de ter acesso aos cuidados de saúde de que necessitam.
Com este aumento, que não vai
resolver nenhum problema financeiro dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde,
o governo dá mais um passo na consolidação do caminho de desresponsabilização
do Estado face à garantia do direito constitucional à saúde e no processo de
privatização em curso.
A medida que devia ser tomada,
não era a do aumento das taxas hospitalares, mas a abolição de todas as taxas
ditas moderadoras.
Ao contrário da manifestação de
grande compreensão expressa pelo
Presidente da República na sua mensagem de Ano Novo, relativamente ao
Orçamento do Estado e do optimismo manifestado face aos “sinais da economia”,
leitura só possível vinda de alguém fortemente comprometido com a política que
tem vindo a ser seguida no país, o ano de 2014 apresenta-se como um ano ainda
mais difícil para a generalidade dos trabalhadores e do povo, pelo que o PCP
reafirma o apelo aos trabalhadores e ao povo, para que intensifiquem a luta
pela resolução dos seus reais problemas, exigindo a ruptura com a política de
direita e eleições antecipadas, passos importantes na luta pela alternativa
patriótica e de esquerda.
Declaração de Jorge Pires, Membro
da Comissão Política.
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